Pelo menos por um dia essa foi a impressão dos universitários e de quem passasse por perto da UEMG (Universidade do Estado de Minas Gerais), Campus de Frutal, pequena cidade mineira com cerca de 60 mil habitantes e localizada no Triângulo Mineiro.
A cidade de Frutal foi “contemplada” com a instalação da “Cidade das Águas”, projeto encabeçado pelo complexo HidroEX, ligado aos órgãos da UNESCO, e que prevê benefícios para toda população, bem como excelência em pesquisas e estudos das águas. Frutal foi escolhida devido ao potencial de suas bacias hidrográficas e do aqüífero Gurarani localizado na região centro-leste da América do Sul, entre 12º e 35º de latitude sul e entre 47º e 65º de longitude oeste e ocupa uma área de 1,2 milhões de Km², estendendo-se pelo Brasil (840.000l Km²), Paraguai (58.500 Km²), Uruguai (58.500 Km²) e Argentina (255.000 Km²). Sua maior ocorrência se dá em território brasileiro (2/3 da área total), abrangendo os Estados de Goiás, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.
Mas e aí? E essa história de Ditadura? Eu explico.
Com a inauguração do prédio sede do HidroEX, localizado dentro do Campus da UEMG-Frutal, autoridades de toda parte da região e do país compareceram ao evento realizado nesta quarta-feira dia 28-09-2011. Ocorre que, com medo de protestos encabeçados pelos professores de Minas Gerais (que encontram-se em greve há aproximadamente 120 dias, na esperança de cumprimento da Lei Federal 11.738-08, http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2008/lei/l11738.htm, que rege sobre o piso salarial nacional dos professores em R$950,00, chegando a R$1.187,00 com as correções monetárias e que em Minas Gerais estão fixados em R$390,00 com proposta de aumento para R$720,00), essas mesmas autoridades proibiram o acesso dos universitários e da população ao prédio estudantil.
O governador Antonio Anastasia (PSDB), principal alvo dos protestos, não compareceu ao evento que teve a presença do ex-deputado Nárcio Rodrigues, ligado ao projeto HidroEX, da atriz Cléo Pires, embaixatriz do projeto, Fernando Haddad, Ministro de Estado da Educação, Arlindo Chinaglia, ex-presidente da Câmara Federal e Deputado Federal (PT-SP), Vice-Governador do Estado de MG, Francine Cousteau (Presidente da Fundação Cousteau), e diversos reitores e pró-reitores de Universidades Federais Mineiras, além de pesquisadores e gestores públicos da Alemanha, Holanda etc. e várias outras autoridades políticas como o diretor geral da UEMG-Frutal Ronaldo Wilson Santos, alvo de protestos por parte dos universitários.
O Diretor Geral da UEMG, Ronaldo Wilson Santos, que não é professor, nunca exerceu nenhuma atividade de pesquisa e docência na vida, é ex-vereador, ex-secretário municipal de educação, correligionário do deputado Nárcio (PSDB) e um dos cabos eleitorais do partido na região. Foi nomeado pelo então Governador Aécio Neves, em julho de 2007 para exercer interinamente o cargo de Diretor da UEMG por 4 anos. Prazo que expirou em julho de 2011. E sua posição no cargo, dentro de uma ética da coisa pública e do conceito de mérito profissional, fere taxativamente o próprio Regimento da UEMG que coloca - a exemplo de qualquer universidade pública - que para ocupar cargos de direção, coordenação etc. é preciso que haja eleição entre os pares e que os professores/as sejam minimamente titulados ou com comprovação de atividades de notório saber na área de pesquisa, ensino e extensão. Ou seja, o cargo é meramente político e de "confiança". O pior é saber (e sabemos) se a Reitoria e o próprio MP sabem disso. E por que não colocam 'ordem na casa'?
Os protestos organizados por professores da rede municipal de ensino e pelos universitários foram focados no pedido do cumprimento do piso salarial nacional de educação por parte dos professores. Já os universitários, além de apoiarem a causa dos professores protestaram contra o cancelamento autoritário das aulas do dia de hoje, que veio a prejudicar vários alunos com o cancelamento, inclusive, de provas, por uma autonomia estudantil, transparência de gestão, construção de calçadas e iluminação na via pública que dá acesso ao campus, falta de concurso público para a contratação de docente, falta de bandejão, biblioteca digna, dentre outras medidas que lembram a Ditadura com as imposições feitas pelo referido diretor geral que controla o campus PÚBLICO como uma instituição Privada. É o Privadão do Wilson.
O ato de fechar as vias públicas para que a população não tivesse acesso à “festa de inauguração” do HidroEX é outro ato de tempos do AI-5.
A manifestação foi pacífica, com uma passeata da praça central da cidade até o ponto de interdição da via principal de acesso ao campus, com reprodução de faixas de protestos, carro de som, pronunciamento dos universitários e professores, controle da polícia militar, presença da imprensa local, intervenção aos carros das autoridades e convidados que chegavam ao evento e panfletos organizado pelo Diretório Central Estudantil (DCE) do campus Frutal, o qual reproduzo abaixo:
“INAUGURAÇÃO POPULAR HIDROEX
Nesta quarta-feira será inaugurada a cidade das águas (HidroEX), em Frutal, um evento que contará com a presença de autoridades municipais, estaduais, federais e internacionais. Um grande projeto, envolvendo muito dinheiro e com a responsabilidade de produzir conhecimento e auxiliar no uso ‘racional’ de recursos naturais, extremamente importantes para reprodução da vida em nossa região e em todo o planeta. Propomos a participação popular em tal evento, pois se trata de um assunto de interesse comum, e não pode ficar concentrado nas mãos de pequenos grupos políticos e econômicos, correndo-se o risco de que se repita um fato rotineiro em nosso país: um bem que está relacionado a toda população, mas privilegia apenas uma pequena quantidade desta.
Mas o que é exatamente o HidroEX? De acordo com o site oficial da fundação (www.hidroex.org):
‘O HidroEX é uma Fundação Estadual, criada pela LEI Nº 18.505, de 4 de novembro de 2009, com autonomia administrativa e financeira, personalidade jurídica de direito público, prazo de duração indeterminado, sede e foro no Município de Frutal/MG.
O HidroEX está vinculado à Secretaria de Estado de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior – SECTES e desenvolverá suas atividades em conjunto com instituições públicas ou privadas, nacionais ou internacionais, especialmente conforme projeto aprovado pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura – UNESCO -, observados o Programa Hidrológico Internacional – PHI – e as normas jurídicas brasileiras e as dos países onde venha a atuar.
O HidroEX tem por finalidade planejar, coordenar, executar, controlar e avaliar programas e projetos de defesa e preservação do meio ambiente, relativos à gestão das águas e dos recursos hídricos, envolvendo a capacitação e o desenvolvimento de recursos humanos, a promoção de ações educativas, a construção de bancos de dados e a prestação de serviços de interesse público’.
Ou seja, é uma Fundação Estadual (lida com DINHEIRO PÚBLICO, e MUITO), tem autonomia administrativa e financeira (faz o que quiser com esse dinheiro público) e é vinculado à Secretaria de Ciência, Tecnologia, Ensino Superior (cujo responsável é o ex-deputado Narcio Rodrigues, extremamente ligado ao projeto, fato que deve ser fiscalizado principalmente em nossa região, principal fonte de votos do mesmo). Esses fatores dão o direito e legitimam o dever da população em participar desse processo histórico que irá ‘transformar’ as relações sociais, culturais, econômicas e ambientais em nossa região.
Deve ser colocado em questão também o real interesse dessa fundação, uma vez que a mesma se proclama um órgão de ‘defesa e preservação do meio ambiente, relativos à gestão das águas e dos recursos hídricos’, mas seu cartão de visitas, e até agora um de seus principais atos, foi despejar entulhos (referentes ao prédio que foi demolido para a construção da sede do HidroEX) em uma ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE, próxima ao CÓRREGO Frutal, a menos de 500 metros do local onde se realiza a CAPTAÇÃO DE ÁGUA para o consumo do município.
É importante analisar se este órgão irá contribuir realmente para o desenvolvimento da sociedade ou favorecerá os interesses econômicos da minoria que se encontra no poder. A universidade é construída por toda a sociedade, e deveria ser de praxe então que ela contribuísse para o desenvolvimento desta. Devemos ficar atentos para o que o HidroEX não caminhe nos rumos de sua vizinha UEMG, com o poder centralizado em poucas mãos, sem concursos públicos, e com ensino público voltado para a lógica do mercado. É preciso acabar com a educação em prol da politicagem e focar no desenvolvimento de um novo ser humano, sem os vícios dessas relações de poder que só cumprem o interesse de certos partidos e grupos econômicos.
Para que adianta o curso de Direito, se aqui na faculdade há injustiças?
O que adianta Comunicação Social, se os alunos não interagem, não se comunicam contra essa catástrofe social que nasce aqui, ao nosso lado?
O que adianta o curso de Sistemas, se é muito difícil o acesso à internet?
O que adianta Geografia e sua importância política, se nos rendemos à politicagem?
O que adianta a UEMG, que foi erguida e é sustentada para o bem da comunidade, dos alunos, para exercer uma função social, porém na maioria das vezes é manipulada pelo interesse pessoal?
Que isso não fique assim.
Que o HidroEX, que está sendo inaugurado, não siga esse caminho.
Que o HidroEX LAVE TODA SUJEIRA QUE HOUVER.
AMÉM”.
A voz da população na deve ser calada.
João Paulo Morandi Barboza. Aluno universitário do curso de Geografia da UEMG-Frutal e proibido de adentrar o prédio PÚBLICO do campus.